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Abrindo Portas – o livro

Me mudei para Irlanda 12 anos atrás. Ao deixar São Paulo, em 2008, eu ainda não tinha claro para mim o que desejava exatamente buscar na fria e chuvosa Ilha Esmeralda, embora soubesse que era muito mais do que aprender inglês e conseguir um bom emprego na Europa (um sonho comum a muitos de nós). Queria abrir uma nova porta que, mais tarde, descobri que viria a me levar a diversas outras que se abriram. Recentemente, depois de ter conquistado muitos dos sonhos que me guiaram ao longo de toda essa jornada, tive contato com um termo em japonês que talvez traduza exatamente aquilo que sempre procurei, sem saber definir: chama-se Ikigai.

Não existe uma tradução literal para a expressão, mas resumidamente ela representa aquilo que é nosso propósito de vida, algo pelo que vivemos e temos paixão, somado ao que efetivamente somos bons (nossa vocação) e, ao mesmo tempo, ganhamos dinheiro para fazer (pois o mundo precisa do que temos a oferecer). Me identifiquei muito com esse conceito, pois acredito que encontrar esse tal do Ikigai sempre foi meu grande desafio, mesmo que a princípio eu não fosse consciente disso.

Desde que saí do Brasil, passei por várias fases, sempre com um objetivo à vista. O primeiro era conseguir um emprego na Irlanda que me permitisse pagar as contas sem precisar converter o euro para o real (e torrar minhas economias, no caso). Depois, uma posição com um salário melhor que me permitisse ter um visto de trabalho (cheguei com visto de estudante). Posteriormente, queria mais tempo livre para continuar trabalhando no E-Dublin nas horas vagas. Até o momento em que consegui um cargo gerencial no Dropbox e, teoricamente, alcancei tudo aquilo que tinha ido buscar no exterior: um emprego dos sonhos, um bom salário, inglês fluente e um visto permanente para ficar na Irlanda por quanto tempo eu desejasse. Mesmo assim, passado um tempo, eu percebi que não estava feliz.

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Costumo dizer que foi como se uma grande bolha ilusória em que eu estava inserido tivesse estourado. O tão desejado emprego não cabia mais nos meus sonhos. Eu não vivia o Ikigai, pois não era mais apaixonado pelo que era pago para fazer. Para piorar, eu e a minha então esposa (a Mah, que talvez você conheça pelo nosso trabalho juntos no E-Dublin), alguém extremamente especial e que sempre me apoiou, começamos a conversar sobre colocar um ponto final na nossa vida de casal. Todas as minhas certezas estavam, definitivamente, sendo desfeitas.

No final de 2018, resolvi tomar coragem e pedir demissão do cargo no Dropbox, abrindo mão daquilo que almejei por tanto tempo. Nesse mesmo mês, eu e a minha, até então, esposa decidimos nos separar. Como toda separação, foi bem difícil para nós dois. Vivemos como um casal por sete anos, casados no papel por 3 anos e, apesar de ainda sermos amigos e trabalharmos juntos, ninguém decide colocar um ponto final em um casamento de tanto tempo do dia para a noite.

Todas essas mudanças marcaram o início de uma nova fase da minha jornada. Após mais de uma década falando sobre intercâmbio e mercado de trabalho na Irlanda por meio do E-Dublin, senti vontade de explorar mais quem é o Edu por trás de tudo o que construí até agora. Muitos me conhecem pelo trabalho que faço nas mídias sociais, onde quase não exponho a minha vida pessoal. Dou dicas de carreira, mas quase não falo da minha. Jogo ideias e opiniões, porém não aprofundo nas experiências que vivi. Nestas páginas, resolvi fazer algo novo não só para você, leitor, como também para mim: pois percebi que escrever sobre si mesmo é um grande exercício de autoconhecimento. É também mais um desafio em que me coloco, pois sempre criei conteúdos curtos, como vídeos, stories e postagens de foto ou texto nas redes sociais. Talvez este seja o conteúdo mais longo que terei feito. É uma versão estendida da maneira que penso e das coisas que fiz e aprendi ─ pelo menos até aqui.

Sei que não enfrentei difíceis barreiras que algumas pessoas se deparam para alcançar seus sonhos. Sou um homem branco, heterossexual, nascido na capital paulista e graças a Deus nunca faltou comida em casa. Contudo, nada disso foi minha escolha. Acredito que entre o que posso escolher, porém, cabe a mim correr atrás para fazer acontecer. Hoje avalio que o Ikigai funciona como uma perfeita bússola para me manter no caminho certo. Entre o público do E-Dublin e os brasileiros com quem convivo fora do Brasil, noto que muitas vezes nos iludimos achando que viver no exterior já é a realização pessoal em si, mas penso que isso é só um pontapé inicial. Ao meu ver, morar fora, aprender inglês, ter uma experiência de intercâmbio são meios para atingirmos um fim que não só nos realiza como entrega algo que o mundo precisa. Aprecio quem tem a atitude de sair da zona de conforto e vai buscar algo novo em outro país. Mesmo assim, quando a mudança se torna apenas uma fuga, sem a tentativa de melhorar algo maior interiormente, o problema acompanhará para onde for. Você continuará enfrentando desafios parecidos com o que encontrava no Brasil até que, de forma efetiva, mude internamente.

Em meados de 2019 fiz um post no Instagram que gerou polêmica, mas ilustra exatamente a ideia que tento expor. Postei uma foto que tirei às 6h40 da manhã de um sábado, no ponto de ônibus, indo para o centro de Dublin para passar oito horas dando um workshop a um grupo de 10 pessoas. Escrevi que, ao chegar à região central, me deparei com alguns “restos de pessoas” voltando das baladas, sendo que muitas delas são as mesmas que enfrentam a típica depressão de domingo porque o dia seguinte é segunda-feira, assim como aconteceu comigo. Eu estava contente por não fazer mais parte daquele grupo e por estar trabalhando no sábado de manhã. Me sentia realizado porque havia pessoas dispostas a estar lá às 7h para ouvir o conteúdo que preparei. No encontro, tentei dar o meu melhor e, de alguma forma, busquei ajudar outras pessoas transmitindo a elas uma informação útil. Essa sensação é incrível. Talvez seja a mesma que um professor sinta ao ensinar uma disciplina pela qual é apaixonado e vê os alunos aprendendo; ou que um chef experimente quando prepara um prato que todo mundo gosta de comer.

Voltando à postagem, fui criticado por ter chamado os que voltavam das festas de “restos” só porque saíram para curtir. Expliquei que o ponto não era esse e que resto foi apenas a palavra usada por mim para dizer que eles estavam acabados ou “só o pó”, e que aquilo era o que sobrava deles. Quis dizer que, como eu fazia até pouco tempo antes, muitos de nós trabalhamos cinco dias infelizes para chegar sexta à noite, encher a cara e esquecer a semana ruim ─ estejamos no Brasil, na Irlanda ou em qualquer lugar do mundo. A mensagem que busquei transmitir foi a de que não quero essa realidade para mim. Não pretendo ter uma vida de cinco dias tristes, sofrendo, para me dar um fim de semana feliz. Pelo contrário: quero ter seis dias felizes e um de estresse, talvez.

Nós “normalizamos” o conceito de que temos que viver uma semana inteira estressante, sempre reclamando quando chega a segunda-feira. Isso é preocupante. Já parou para pensar que é ruim estar insatisfeito com 70% da sua vida e não ver a hora dos outros 30% chegarem? Ao agir assim estamos basicamente jogando fora cinco dias da semana e, pior, acreditando que isso é normal, só porque todo mundo faz. Passei por isso no fim da minha passagem pelo Dropbox e penso o seguinte: quando não estou feliz, o que posso fazer para mudar?

Não acredito que a solução seja simplesmente “largar tudo” e “se jogar” virando um nômade digital passando perrengues ─ dei esse exemplo porque é uma opção muito cogitada por aqueles que sonhem em morar fora. Na minha opinião, o mais adequado é preparar um plano com consciência, ser racional, avaliar seus aprendizados e montar uma estratégia. Apesar de eu ser uma pessoa que segue muito os próprios instintos, sempre busco formas de racionalizar e estipular metas e planos para executar o que minha intuição me diz.

“Largar tudo” sem plano, só pelo fato de estar cansado, pode trazer um alívio imediato, mas causar um grande estresse a longo prazo. Gosto de exemplificar essa ideia com a estratégia utilizada pelos investidores. Quando eles resolvem apostar em uma empresa, já o fazem pensando em qual será o plano de saída deles. Investem de olho no potencial de crescimento do negócio e o quanto ganharão na hora de vender as ações. Devemos fazer o mesmo com as nossas vidas e montar nosso plano de saída da realidade de ficar triste todas as segundas-feiras.

Entendo que nenhuma mudança precisa acontecer drasticamente do dia para a noite, e sim gradualmente. Há alguns anos, tive contato com um conceito chamado ganhos marginais, com o qual me identifiquei bastante. A origem dele está no time britânico de ciclismo. Até 2002, a equipe era mediana e sem destaque em Olimpíadas, tendo ganhado apenas uma medalha de ouro em 76 anos de história. Até que um técnico novo, motivado pelas Olimpíadas de 2012, que seriam sediadas em Londres, transformou os resultados da equipe graças à técnica de melhoria contínua, que é alterar detalhes para incrementar ganhos mínimos, na casa do 1%, em diversos âmbitos, e trazer um resultado competitivo ao final. Ele tomou medidas que, à primeira vista, pareciam irrelevantes, como usar travesseiros para que os atletas dormissem melhor ou fazer ajustes irrisórios nas bicicletas para andarem milésimos mais rápido. O que acontece é que a soma dessas pequenas melhorias levam a uma grande mudança. Nas Olimpíadas de 2008, a equipe ganhou 7 medalhas de ouro. Em 2012, levaram 7 ouros de novo. Gosto desse exemplo porque, muitas vezes, focamos apenas em grandes coisas a serem resolvidas e não nos damos conta de que, se começarmos de pouquinho em pouquinho, mudando uma coisa aqui ou ali, os resultados aparecem.

Se você está acostumado à “normalidade” de reclamar todo começo de semana, experimente fazer mudanças aos pouquinhos e acreditar mais que você é capaz de viver diferente. Às vezes tudo o que precisamos é acreditar um pouco mais em nós mesmos, entender por que fazemos o que fazemos, montar “um bom plano de saída” e nos esforçarmos para sermos pessoas um pouco melhores. Quando fazemos o que gostamos e, sobretudo, o bem para alguém, impactamos positivamente o mundo, conseguimos ter uma vida muito mais digna e nos sentimos bem ─ inclusive às segundas-feiras.

E que fique claro: não quero ser utópico e estou longe de acreditar que esse estado de realização, uma vez alcançado, é constante. Não existe um momento da vida em que falamos: “Pronto, agora estou vivendo o meu sonho, chegou a hora de parar por aqui porque alcancei o que queria”. Esse dia nunca existirá. Ao menos, é como funciona para mim. Sempre que me aproximo de um sonho, ele corre para mais longe e se transforma em outro: uma nova meta profissional, ser uma pessoa melhor, ser mais saudável, ganhar mais dinheiro, viajar mais ou seja lá o que for, o fato é que achamos algo para colocar no lugar do antigo sonho realizado.

E foi assim que, depois de centenas de vídeos no YouTube, Instagram, LinkedIn e literalmente milhares de artigos no E-Dublin, chegou a hora de fazer uma documentação mais pessoal, reflexiva e longa (de 235 páginas para ser mais preciso), e em um novo formato: um livro.

Livro Abrindo Portas por Edu Giansante

Este livro, por exemplo, é mais uma das coisas que eu queria realizar e, se você o tem em mãos, é porque deu certo. Provavelmente, quando você estiver lendo estas palavras eu já estarei correndo atrás do meu próximo desafio. No final das contas, talvez seja justamente isso que estou compartilhando aqui: minha jornada em busca de concretizar sonhos, que sempre se renovam. Quem sabe, ao fazer isso, eu consiga realizar meu Ikigai e, consequentemente, te ajude a se aproximar também do seu.

Fiquem com Deus,
Edu

Livro “Abrindo Portas”, já disponível:
Livro físico (Amazon Brasil)
Versão Kindle (Brasil)
Versão Kindle (UK)

Edu Giansante

Fundador e CEO do edublin, Edu chegou na Irlanda em 2008, no ano pré-crise, pegou a nevasca de 2010 e comeu cérebro de cabra em Marrakesh. O Edu também é baterista da banda Irlandesa Medz.

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