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Casal de brasileiros a bordo de um motorhome pela Europa

Na busca por Segurança viemos para Dublin, mas foi a Liberdade que nos fez decidir viver e morar em um motorhome, o Rogerinho.

Percebemos que saímos do Brasil em busca de segurança, mas que ela não era tudo, então decidimos mudar. Foto: Arquivo Pessoal

Liberdade e segurança – Zygmunt Bauman dizia que esses são os dois valores essenciais a uma vida satisfatória e que uma existência digna não se faz possível na ausência de um deles. O grande problema, segundo ele, é que esses dois valores são excludentes entre si. Toda vez que você obtém mais segurança, você entrega um pedaço da sua liberdade. E toda vez que você alcança mais liberdade, você abre mão de uma parte da sua segurança. Não há outra maneira. 

Em 2018, eu e minha namorada, Eve, colocamos em prática um plano que demoramos mais de um ano para amadurecer: nos mudamos para um motorhome. Foi uma mudança extrema em busca de mais liberdade. Mas essa nem sempre foi minha vontade.

Assim como a maioria das pessoas, eu passei grande parte da minha vida buscando por segurança. É o curso natural das coisas e é muito difícil se esquivar da influência implacável do sistema. Nossa formação passa por vários estágios, mas o objetivo final é um só: nos fazer consumir. E para consumir nós precisamos de dinheiro, e o que é o dinheiro se não a maior de todas as seguranças?  

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Como é viver no espaço mínimo de um motorhome? Bem apertado, mas possível. Foto: Arquivo Pessoal

Em 2017, tentando ganhar um pouco mais de liberdade, eu me mudei para Dublin e no começo dessa nova vida eu realmente me sentia mais livre. Tudo era novidade, as pessoas, os lugares, as sensações. Foi nessa época que conheci a Eve e através de longas conversas fomos descobrindo como eram parecidos nossos anseios e desejos por uma vida mais simples.

Percebemos então que aquela empolgação inicial foi se esvaecendo e dando lugar a uma nova rotina, e que a mudança para o exterior não passava de uma busca por ainda mais segurança.  Não me entenda errado, nós amávamos Dublin e a cidade pra sempre ficará marcada para nós como um símbolo de mudança. Mas algo dentro de nós clamava por uma vida mais simples e sabíamos que não teríamos outra opção além de atender ao insistente chamado.

Foi assim que, com apenas 6 meses após minha chegada em Dublin, nós decidimos que moraríamos em um motorhome. Começamos então a guardar dinheiro e a pesquisar muito. Um ano depois era chegada a hora de deixar a Irlanda. 

Com seis meses na Irlanda, ao invés de renovar o nosso visto, decidimos cair no mundo a bordo de um motorhome. Foto: Arquivo Pessoal

Nem tudo são flores a bordo de um motorhome

Essa é história de como viemos morar no Rogerinho, nome que carinhosamente demos ao nosso motorhome. O baque inicial foi grande e a primeira coisa que sentimos foi a falta de espaço. O Rogerinho é um modelo menor que a maioria dos campers e sua área interna não passa de 3m², por isso cada centímetro deve ser otimizado.

Hábitos considerados básicos, como o banho e a ida ao banheiro, ganharam uma nova perspectiva. Só com água fria disponível, nosso banho é de garrafinha com água fervida no fogão. Quanto ao banheiro, evitamos ao máximo usar o do motorhome porque o cheiro pode se tornar bem desagradável, por isso estamos sempre usando sanitários públicos ou de cafés e restaurantes.

A busca pela segurança ficou para trás

Com relação à segurança, nossa estabilidade financeira não existe mais e teremos que nos virar com trabalhos temporários e de freelance. Até mesmo nossa segurança física está mais frágil, afinal, apenas alguns centímetros de lataria velha separam a rua de onde dormimos.

Tudo isso junto à saudade de Dublin e o medo de ter jogado fora algo tão certo fez dos primeiros dias um desafio. Mas nossa adaptação foi rápida e, em pouco tempo, começamos a sentir os efeitos da liberdade recém conquistada.

Aprendemos a contornar a falta de conforto inicial e agora nos sentimos livres dos hábitos que considerávamos indispensáveis. Já o sentimento de liberdade de viver sobre rodas é praticamente indescritível. Começamos nossa viagem na Holanda e em 24 dias dormimos em 16 lugares diferentes.

Nesse pequeno período de tempo já tivemos a chance de conhecer lugares e pessoas que ficarão marcados pra sempre em nossas lembranças, e saber que cada nascer do dia traz consigo outras chances como essa é extremamente empolgante. 

Dormir em 16 lugares diferentes em um curto espaço de 24 dias ilustra como o mundo é uma caixinha de possibilidades. Foto Arquivo Pessoal

Nós não temos a mínima pretensão de afirmar que encontramos a fórmula para uma vida satisfatória. Até onde sabemos, essa jornada pode terminar tão logo quanto na próxima semana. Bauman mesmo já dizia que ninguém nunca encontrou o equilíbrio perfeito entre liberdade e segurança e já alertava para os perigos de uma vida muito próxima dos dois extremos.

Segundo ele, segurança sem liberdade é escravidão, e liberdade sem segurança é um caos total. Sabemos que ainda vamos errar muito em busca do equilíbrio, mas sabemos também que preferimos errar pelo excesso, e se o excesso nos fizer flertar com algum dos dois extremos, então que seja com o caos e nunca com a escravidão. 

Sobre os autores:

Nós somos um casal vivendo e viajando pela Europa no nosso motorhome, o Rogerinho. Deixamos os nossos empregos e vidas em Dublin para tentar uma vida nômade, trabalhando e morando na estrada. Para quem quiser acompanhar essa aventura em busca do equilíbrio entre a Segurança e a Liberdade basta seguir o casal no Instagram @rotaalternativarv.

Ávany França

Jornalista por profissão, já passou por editorias de moda, gastronomia, história e turismo. Uma vida sem desafios não foi desenhada para essa baiana de Salvador. Amante das viagens, coleciona mais de 80 destinos no passaporte. Quer saber mais? Corre porque até você terminar de ler esse perfil já terei alguma novidade.

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