Mas como a vida não é simples, aprendemos que a frase “sabe de nada, inocente!” é muito verdadeira. Pois bem, já no meu primeiro dia, após 8hs de escala em Frankfurt e chegando à Dublin meia-noite, eis que já percebo que as coisas seriam diferentes. Como havia pago 2 semanas de acomodação, fui direto pra lá e, na maior fossa do mundo, minha roommate (brasileira) me atendeu, explicou como o funcionavam as coisas, se colocou à disposição e foi dormir.
Lembro claramente de, após tomar um banho bem quente, deitar na cama e agradecer aos céus, pois sabia que essa seria uma amiga pro resto da vida. E olha que não estava errada, ela foi minha roommate por quase oito meses e minha amiga do coração até hoje.
Mas as surpresas não pararam aí!
Vivi por 2 meses nessa mesma acomodação, uma casa enorme com oito quartos e umas 20 pessoas, todos brasileiros. Com o passar dos dias todos começam a se conhecer melhor e o que dizem sobre a intensidade que as coisas acontecem em um intercâmbio, é muito real.
Um mês depois de ter chegado já estava recebendo uma festa surpresa no meu aniversário de 29 anos, feita por eles. Veja só, eu que achava que seria complicado fazer amizades e confiar em pessoas que nunca vi antes, estava completamente emocionada no meu aniversário, que contou com doces e salgadinhos. Simplesmente sensacional! Sou muito grata com isso até hoje.
E o mais engraçado disso tudo é que quando você menos espera já se sente super próximo dessa que certamente se tornará a sua família aqui. Antes de embarcar, nas minhas conversas com quem morava na Ilha conheci um rapaz que me indicou conversar com uma menina que também já estava em Dublin há um ano. Conversamos e marcamos de nos encontrar dois dias depois que chegasse na cidade. E ela foi a responsável por caminhar comigo pelo centro pela primeira vez e me dar dicas e informações básicas sobre Dublin. Resultado? Amigas até hoje, também!
Sem contar nas pessoas que conhecemos durante as aulas de inglês e com quem passamos pelo sofrimento de estudar no frio “gostoso” da Irlanda. Uma conversa aqui, uma piada ali e de repente já participava de um grupo com pessoas ótimas, onde um ajudava o outro a encontrar acomodação, emprego, etc. Realmente, não tenho do que reclamar, só agradecer!
São brasileiros de diveras partes do país, que estavam em busca da mesma coisa, a experiência do intercâmbio. Cada um pelo motivo que lhe cabia, mas todos voltados para a mesma direção.
E passou o Natal, o Ano Novo, o Carnaval, veio o St. Patrick’s, Dia da Mães, aniversários… e a amizade foi crescendo a ponto de quando alguém decidia voltar para o Brasil, o choro se instalava por alguns dias. Afinal, como desapegar de alguém que vivemos diariamente e com quem vivemos momentos únicos?
Saber que o retorno à pátria significa o fim dessa convivência se torna uma daquelas lembranças bem doloridas. Acredite, fiz parte de uma família de verdade, com direito a brigas, abraços, choros, porres no momento da saudade, no momento da felicidade, mais abraços e o mais importante, o amor que só um amigo pode dar.
Sei que há muitas controvérsias sobre manter contato com brasileiros ou fugir deles durante o intercâmbio. No final, o discurso pré-intercâmbio da maioria é: “quero morar com gringo”, “vou correr dos brazucas”, mas na prática a gente logo descobre que tudo isso é uma bobagem. Afinal, como citei acima, todos estamos no mesmo barco e dividir os momentos dessa experiência em um ambiente tão diferente do nosso é bem importante no processo todo.
Só nós saberemos o valor que foi aquela conversa em um dia ruim, a ajuda de um amigo durante um choro, ou o abraço de felicidade por mais uma conquista, seja pequena ou grande. As risadas em um jantar comunitário regado a batata frita, nuggets e todas as possíveis variações de frango. Nos momentos de perrengue, na hora de uma indicação de uma vaga, de uma dica sobre saúde, ou sobre como sair daquela roubada. No final, são eles, os brasileiros, amigos de casa, de quarto, de pub, que surgem para te dar a mão.
São eles, também, os que embarcarão com você nos passeios pela Irlanda ou mochilões fechados durante a madrugada pra aproveitar as promoções da Ryanair. Os dias no parque, a alegria em ver neve, a felicidade plena em sentir o sol após tantos meses no frio cobertos de blusas.
Entendo hoje que estar aberta ao novo possibilitou não somente me conhecer mais e viajar por lugares incríveis, mas também me aproximar de pessoas maravilhosas que, assim como você e eu, só querem ser feliz.
O intercâmbio me mostrou o quão simples pode ser a vida e o quanto precisamos lutar para não complicá-la. Concordo que ao retornar ao Brasil é difícil manter o foco em tudo aquilo que aprendemos e refletimos durante o intercâmbio, pois a vida é corrida e as pessoas que não passaram por tudo isso muitas, mas muitas vezes mesmo, não entendem a reviravolta que ocorre dentro da gente. Mas uma coisa eu garanto, o carinho, o respeito e agradecimento por diversas pessoas que, de forma simples ou grandiosa, foram especiais durante o meu intercâmbio, eu levarei comigo pra sempre.
A dica que eu dou desde já é: desate-se de seus preconceitos, esteja aberto para o novo, para o outro, para a oportunidade de estar com alguém que talvez em uma circunstância normal no Brasil, jamais daria certo, mas que aqui, na intensidade louca que é o intercâmbio, o improvável torna-se provável. Aprende-se e muito compartilhando histórias, fazendo confidências, com as lágrimas dos outros e muitas vezes a sua. No final, nos tornamos sim uma Irish Family, alguns ocuparão um lugar de verdade em nossas vidas, outros se perderão pelo caminho, mas de uma forma ou de outra cada um deixará um pouquinho de si na nossa história e principalmente nas nossas memórias.
“Começando Meu Intercâmbio” é uma série que surgiu para ajudar os recém-chegados à Irlanda nos seus primeiros passos na Ilha Verde. Além do próprio relato da nossa colunista Carol Braziel, os textos serão sempre recheados de links úteis, com dicas e o passo a passo para cada uma das etapas (abertura de conta bancária, procura por acomodação, GNIB, procura por emprego diversos detalhes do dia a dia na Irlanda).
Revisado por Tarcisio Junior
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