Como 9 mil crianças morreram em casas de acolhimento a mães solteiras na Irlanda
4 anos atrás
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Uma mancha na história da Irlanda veio à tona no início de janeiro, após um pedido de desculpas formal do governo irlandês por um capítulo cruel (para não dizer bizarro) do passado.
As chamadas “Mother and baby homes” (“lares da mãe e do bebê”, em tradução literal, ou Casa das Mães Solteiras, como também eram conhecidas essas instituições semelhantes no Brasil) eram locais existentes na ilha entre 1925 e 1998, onde mulheres grávidas eram levadas por suas famílias para terem seus filhos longe do julgamento da sociedade por não serem casadas.
Durante décadas, a Irlanda condenava ao ostracismo mães que tivessem filhos fora do casamento. Expulsas de casa e grávidas, elas não tinham onde se abrigar e, assim, surgiram esses locais, comandados, geralmente, por freiras católicas.
No entanto, muitas mães que eram levadas para terem seus filhos nestes locais morriam pela falta de estrutura, higiene e recursos. Os bebês também. E pior: os corpos eram enterrados por ali mesmo, em valas comuns.
Crianças que sobreviviam, conviviam com suas mães até serem separadas de forma forçada. A maioria das crianças eram adotadas por famílias dos Estados Unidos, que pagavam para as instituições como forma de conseguir uma adoção rápida.
Nove mil crianças mortas foram descobertas por comissão irlandesa
Depois de décadas de investigação, no dia 12 de janeiro de 2021, o governo irlandês publicou o “Final Report of the Commission of Investigation into Mother and Baby Homes” (relatório final da comissão de investigação sobre as “Mother and Baby Homes”).
A conclusão do relatório mostra que cerca 35 mil partos foram realizados nestas casas e 9.000 crianças morreram em 18 instituições investigadas, o que significa aproximadamente 15% dos bebês que nasceram e viveram nestes locais.
No dia 13 de janeiro, o Taoiseach (primeiro-ministro irlandês) Micheál Martin emitiu um pedido formal de desculpas aos ex-residentes das “Mother and Baby Homes” em nome do Estado da Irlanda. Ele falou ao Parlamento Irlandês sobre o caso ser um “profundo erro de geração” e que a Irlanda tinha “uma atitude completamente distorcida em relação à sexualidade”.
“Jovens mães e seus filhos e filhas foram forçados a pagar um preço terrível por essa disfunção”, disse.
A primeira ‘Mother and baby home’
A ordem de freiras católicas Sisters of Bon Secours gerenciou uma antiga casa em Tuam, no condado de Galway, que abrigava mães solteiras e seus filhos. O local era precário e remetia à época da Grande Fome, onde famílias carentes eram abrigadas.
Em média, uma criança morria a cada duas semanas durante o funcionamento da casa, entre 1925 e 1961. Depois de fechada, as crianças residentes foram espalhadas por outros lares que funcionavam na Irlanda. E a situação continuou a ocorrer.
A importância da casa de Tuam é grande, pois foi ali que começaram as primeiras investigações sobre o que ocorria dentro da instituição. Tudo começou em 1975, quando garotos que brincavam no terreno onde estava localizada a casa, anos antes, encontraram ossadas humanas.
Na época, acreditavam serem restos mortais do período da Grande Fome, mas uma historiadora amadora irlandesa, Catherine Corless, começou a investigar o caso e foi descobrindo o passado sombrio de Tuam.
As descobertas de Catherine
Décadas depois do fechamento do lar de Tuam, Catherine publicou um artigo chamado “The Home”, em 2012. Nele, ela relata a história daquele local e as vidas de crianças que foram perdidas por doenças dentro da instituição, onde lá mesmo eram enterradas, mesmo sem registros.
Ela identificou 798 crianças mortas em Tuam e uma campanha foi criada para que o local virasse um memorial com seus nomes. Em 2014, o caso ganhou a grande mídia e ficou conhecido mundialmente. Quatro anos depois, a historiadora foi reconhecida com o prêmio “Ireland’s People of the Year”.
Comissão investigou caso de Tuam
Uma comissão foi aberta pelo governo irlandês para comprovar a história de Tuam em 2014 e de outros lares, que funcionaram pelo menos por 76 anos, de 1925 a 1998. Escavações foram autorizadas em Tuam em 2016, que confirmaram um número significativo de restos mortais de bebês prematuros e com até três anos de idade em 20 câmeras que seriam para armazenamento de água.
Em 2019, um relatório mostrou um número total de 802 corpos de crianças e de 12 mães.
Outras casas foram também investigadas, como em Bessborough, no condado de Cork, onde 900 crianças morreram.
Dublin também teve instituições para mães e bebês
Entre 1920 e 1998, 15.382 mulheres e 18.829 crianças foram admitidas em Pelletstown, a “Mother and baby home” de Dublin, localizada na St Patrick’s, Navan Road, em Dublin 7, e administrada pelas “Daughters of Charity” (filhas da caridade).
Em 1920, a taxa de mortalidade infantil em Pelletstown era de 50%. De acordo com artigo da RTÉ, 3.615 mortes entre bebês e crianças ocorreram em Pelletstown, com as principais causas de morte sendo debilidade congênita, prematuridade, infecções respiratórias e gastroenterite. A maioria das crianças, 59%, estava sozinha no momento de sua morte.
Das crianças admitidas, 5.888 ou 31% estavam desacompanhadas dos pais, algumas registradas como “abandonadas”. Um total de 367 crianças foram enviadas para adoção estrangeira, com 90% indo para os Estados Unidos e 7% na Grã-Bretanha.
Leia também: Você conhece a história da Irlanda?
Lei bloqueou o acesso à informação
Informações coletadas pela comissão foram bloqueadas em uma “legislação urgente” que, segundo o governo, tem como objetivo “proteger a informação”. Os bancos de dados podem ajudar a busca de famílias por antepassados, portanto, contêm informações confidenciais.
O presidente irlandês Michael D Higgins sancionou o projeto de lei sobre registros.
O relatório final, publicado no dia 12 de janeiro, a comissão faz 53 recomendações, incluindo compensação e memorialização, mas uma coalizão de sobreviventes das “Mother and Baby homes” afirmou ter “sentimentos confusos” sobre o relatório que foi finalizado com muito atraso.
Filmes ilustram situação na Irlanda
As centenas de histórias sobre as casas de mães solteiras na Irlanda foram combustível para a sétima arte. Filmes levaram para as telonas dramas envolvendo mulheres e seus bebês.
O mais conhecido deles é Philomena, drama de 2013 dirigido por Stephen Frears e baseado no livro The Lost Child of Philomena Lee (2009), do jornalista Martin Sixsmith. Ele conta a história real da busca de 50 anos de Philomena Lee por seu filho que lhe foi tirado à força em uma Mother and Baby home irlandesa. É possível assistir na Amazon Prime e pelo Youtube.
Outros documentários também contam histórias sobre o tema. O curta “Mother and Baby”, de 2017, narra os acontecimentos em Tuam e tem como destaque a historiadora local amadora Catherine Corless, que se aprofundou no passado da pequena cidade irlandesa.
Children Of Shame, de 2015, disponível na Amazon Prime, também investiga a história de Tuam, traçando a jornada de mães solteiras e filhos desaparecidos. Ele foca em John Rogers, uma das dezenas de milhares de crianças tiradas de sua mãe.
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