Dublin é um dos destinos mais procurados pelos intercambistas do mundo todo. Nas ruas, não é difícil ouvir diferentes línguas passeando entre o idioma nativo. A cidade está tomada por diversas etnias, culturas e cores.
De acordo com um estudo recente do Economic and Social Research Institute, o número de estudantes internacionais na Irlanda teve um crescimento de 45% entre 2013 e 2017, o que contribuiu bastante para essa mistura.
O intercâmbio, como sabemos, é um verdadeiro privilégio. Poucos têm a oportunidade de experimentar a vida de estudante em outro país. No Brasil, a discrepância entre o número de negros e brancos matriculados em instituições de ensino superior, por exemplo, ainda é gritante.
Apenas 30% das cadeiras das universidades brasileiras são ocupadas por negros, de acordo com informações do INEP, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas. E quando o assunto é intercâmbio, os dados não são muito diferentes. De todos os estudantes que se beneficiaram do falecido programa “Ciências sem Fronteiras”, apenas 26% eram negros, segundo dados divulgados pelo MEC.
Para os pré-intercambistas negros que estão no Brasil, surgem inúmeras dúvidas, aflições e receios antes de embarcar para um país com uma cultura diferente e onde a população é majoritariamente branca. Convidamos intercambistas negros na Irlanda para ajudar e aconselhar aqueles que ainda não pousaram por aqui.
De acordo com um estudo realizado em 2015 e 2016, a Irlanda está ranqueada como o segundo pior país da União Europeia quando se trata de violência contra pessoas negras. Foram entrevistadas quase 6 mil pessoas em 12 países diferentes.
No ambiente de trabalho, a notícia também não é boa. Segundo o relatório Ethnicity and Nationality in the Labour Market, o grupo de negros não-irlandeses têm menos chances de ser contratados e, quando empregados, também têm menos chances de conseguir se estabelecer em funções de gerência do que irlandeses brancos.
Na opinião da advogada Emilly Laise, que mora há 2 anos em Dublin, o racismo na Irlanda é bastante vedado. Antes de embarcar, ela procurou vídeos sobre violência racial no país, preocupação essa que se estendeu também para o seu pai. Ele temia que a filha fosse agredida em um “país de brancos”.
“Na minha opinião, baseada nas minhas experiências pessoais e nos irlandeses que eu conheci, o racismo existe sim. Eles vão tratar você muito bem, isso porque o politicamente correto é muito prezado aqui. Eles se esforçam para serem sempre corretos. Eles vão rir com você, vão respeitar, mas não vão se misturar muito”, explica Emilly.
Nenhuma mulher está livre de sofrer atitudes machistas que estão profundamente enraizadas na nossa sociedade. Quando se trata da mulher negra, ainda há uma hiperssexualização do corpo que rende horas de discussão e aprofundamento pelos viés antropológico e sociológico.
A dançarina Alessandra Azevedo sentiu os reflexos disso na pele no ambiente de trabalho. No primeiro dia como hostess em um restaurante 5 estrelas, ela pediu demissão por conta da reação que recebeu de homens e mulheres que frequentaram o estabelecimento.
“Eu falava com as clientes e as direcionava à mesa. É um posto de servir, mas com certa igualdade, como uma anfitriã. No final do expediente eu cheguei em casa e chorei. Eu percebi o quão objetificado é o corpo da mulher negra. Os homens olham de forma extremamente sexual e as esposas com incômodo e indignação, não só pela reação de seus maridos, mas também por uma mulher negra ser a responsável por recebê-la”, conta a intercambista.
Uma das perguntas mais frequentes, principalmente pelas mulheres negras pré-intercambistas, é sobre cabelo. Manutenção de tranças, corte afro e produtos para cabelo crespo são temas que geram preocupação. A verdade é que a gama de produtos capilares encontrada nas prateleiras do Brasil não é a mesma daqui. Nem de longe.
Porém, todas as meninas entrevistadas garantiram que é possível cuidar dos cabelos em Dublin sem grande dificuldade. Na região central da cidade tem salões de beleza especializados em cabelo afro com profissionais, geralmente africanas, bem qualificadas.
Alessandra, por outro lado, chama a atenção para a diferença entre o cabelo africano e o afro-brasileiro. “A gente tem uma grande variedade de tipos e texturas de cabelos no Brasil e nem sempre o que funciona para as africanas vai funcionar pra gente. É preciso testar até encontrar um produto que corresponda”, explica.
Por precaução, as meninas deram a dica de trazer um bom estoque do Brasil e, no pior das hipóteses, pedir para alguém que está vindo para a Irlanda trazer mais quando estiver acabando.
É imprescindível se manter conectado com suas raízes mesmo quando imerso em uma nova cultura. A intercambista Soraia da Silva se surpreendeu com a comunidade africana presente em Dublin, mas conta que levou tempo para descobrir a comunidade negra brasileira. Soraia conta também que ficou muito contente com a presença de centros de religiões de matriz africana.
“Eu frequentava o Candomblé no Brasil e me sentia muito bem. Aqui, eu encontrei centros de Umbanda, o que se aproxima bastante. A questão da espiritualidade, da religiosidade é muito importante. É algo que faz falta para quem tem isso no Brasil e está vindo para cá”, explica.
Confira alguns dos trabalhos de representatividade e ativismo negro realizados por brasileiros aqui na Ilha:
Criado recentemente pelos intercambistas Carine Queiroz, Rodrigo Souza, Juliana Peixoto, Soraia da Silva, Tindarina Alves, Alessandra Martins e Sara Ribeiro, o grupo é formado por 13 pessoas, entre elas homens e mulheres, em sua grande maioria negros, com o objetivo de expressar a cultura por meio da arte.
As reuniões acontecem quinzenalmente, quando os estudantes debatem, entre outros assuntos, política, cultura e poesia. No dia 20 de novembro celebra-se o Dia da Consciência Negra, e o coletivo vai se reunir para uma intervenção cultural em frente ao GPO, General Post Office, na O’Connell Street.
A dançarina, coreógrafa e fundadora do “Criola Dance”, Alessandra Azevedo dá aulas de danças afro-brasileiras, entre elas, a capoeira. Além disso, ela também promove workshops e performances. O horários das aulas podem ser encontrados nas suas redes sociais.
A artista de designer Thaís Muniz possui um vasto trabalho na internet onde compartilha o conhecimento histórico, cultural e político por detrás dos turbantes. Além de sua conta no Instagram, recheada de tutoriais, ela também dá workshops no mundo todo e tem uma loja online.
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