Após passar todo o sufoco da procura por uma residência fixa, com entrevistas que mais pareciam vagas de emprego e sendo julgado e analisado por promissores flatmates, enfim encontro um lugar agradável e tranquilo para morar! Mas aí vem a segunda parte do processo! Será que conseguirei me adaptar a uma casa com jovens e outro ritmo de vida?
Muita gente me perguntou se o fato de já ser um “tiozão” dificultou na procura por residência. Eu posso dizer que isso depende muito do que você procura e de como você se apresenta.
Confesso que um dos meus maiores receios era cair em uma casa repleta de jovens e sem regras. Mas esse receio se dissipou logo após as minhas primeiras semanas no novo lar. E, na verdade, acredito que, seja durante o intercâmbio ou no Brasil, essa coisa de convivência é complicada e o melhor caminho é sempre impôr limites e respeitar o espaço do outro.
No Brasil eu morava sozinho e tinha um apartamento inteiro para chamar de meu. Ao chegar em Dublin, sabia que essa realidade iria mudar e que dividir espaço com outros estudantes seria inevitável. Então, o primeiro desafio para mim foi ter essa consciência de que o meu “home sweet home” seria “our home”, ou seja, meu e de mais uma turma, os famosos “flatmates”.
Muitas vezes os nossos futuros colegas de casa vêm de uma realidade completamente diferente da nossa. Muitos estão saindo da casa dos pais pela primeira vez para enfrentar o intercâmbio, e não vivenciaram nem um terço das experiências que um quase quarentão já enfrentou. Essa disparidade certamente pode trazer conflitos, mas também muita oportunidade para troca e aprendizado. Aí vem o desafio de estar preparado para conviver da melhor maneira possível sem bancar o durão, ou o sabe tudo. Ter paciência certamente entra potencialmente no pacote.
E quando digo isso, vale para os dois lados. Já que com a idade surgem também certas manias, fingir que elas não existam é bem difícil. Sendo assim, para quem divide espaço com os mais maduros alguns desafios também surgirão pela frente. É ai que temos de encontrar um consenso, para que o clima da casa seja agradável e não atrapalhe a convivência.
E os desafios não param por aí. Se por um lado os jovens podem ter uma perspectiva mais light de lidar com a vida, já que muitos deles ainda possuem alguém para se preocupar com eles e para socorrê-los em um momento de emergência, do lado de cá a coisa é bem diferente.
A louça já foi lavada? A roupa foi recolhida? Não é melhor evitar isso ou aquilo? Esse senso de organização, de ver as coisas no lugar, de pôr ordem em tudo, também pode ser um dos grandes problemas na convivência com os flatmates. Até porque quando dividimos o mesmo espaço, ou mesmo quando o colega está doente, você acaba se preocupando com ele. É o instinto materno ou paterno agindo sobre você, natural de qualquer pessoa que possui um pouco mais de experiência com a vida. Aí nossos colegas de casa deixam de ser os flatmates e passam a ser os filhos de criação. Muitos até nos chamam de “pãe”, uma mistura de pai e mãe, devido às cobranças e preocupações que temos com eles.
O problema é que a linha que separa o flatmate atencioso e o mandão é muito tênue, e pode acabar gerando alguns desentendimentos. Por isso, saber pesar nossas atitudes e tentar entender os limites dos outros é fundamental.
O bom dessa experiência é que aprendemos a compartilhar ideias e conhecimentos. É gostoso quando a gurizada vem e nos pergunta coisas que não viveram, ou fazem questionamentos históricos no qual passamos enquanto muitos deles nem haviam nascido. Também é bom quando temos alguns problemas do dia-a-dia do intercâmbio e podemos contar com eles porque é algo mais comum na rotina deles, já que, na maioria das vezes, o intercâmbio é desenhado para a turma mais jovem.
No final das contas percebemos que a questão da moradia é apenas mais um desafio, igual a todos os outros que enfrentamos na vida. Medos, inseguranças e ter uma postura mais flexível são apenas alguns itens da lista que teremos que aprender mês a mês! A convivência certamente trará conflitos, mas sempre cercados de aprendizado. Seja o de aprender a ouvir mais, o de se conter para evitar maiores turbulências, ou questionar e ser questionado. A convivência do intercâmbio em um ambiente de diversidade etária nos dá a oportunidade de ver outra perspectiva da vida.
Fácil certamente não será, mas no final da viagem, seja para os mais jovens ou para os mais vividos, será uma experiência gratificante e de muito aprendizado.
Fabiano de Araújo é gaúcho de carteirinha, mas catarinense de coração. Formado em Comércio Exterior, trabalhou 10 anos com exportação. Um belo dia resolveu largar tudo e encarar um intercambio próximo dos 40 anos, como forma de entrar na melhor idade realizando sonhos. Amante por viagens inesperadas está sempre com uma mochila pronta para encarar desafios. Resolveu compartilhar de sua aventura com os demais por acreditar que nunca é tarde para realizar sonhos.
Revisado por Tarcisio Junior
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