Entrei na sala de embarque sem olhar para trás. Ver meu passado poderia me fazer desistir do futuro. Entrei sozinho e fiquei observando os outros. Quase me arrependi. Para quê largar tudo? Festas nas casas dos amigos e almoços aos domingos, um emprego estável, um carro próprio, um apartamento alugado. Tudo que, como dizia Raul Seixas, fazia de mim um cidadão respeitável.
Resolvi começar uma vida nova. Enchi duas malas de roupa, esperança e expectativa. O medo entrou, sorrateiro, na mochila, mesmo eu tentando evitá-lo. Uma tal de saudade antecipada também se escondeu e veio sussurrando no meu ouvido o caminho todo. Eu não sabia o que me esperava do outro lado do mundo. Eu só conhecia o que eu deixava para trás. O novo poderia ser melhor ou pior. Sem dúvida, seria diferente.
À medida que o avião ganhava o céu, foi tudo ficando para trás. Sensação de liberdade e medo aumentavam na mesma proporção. O que eu queria mesmo? Melhorar meu inglês? Não era só isso. Eu queria mudar a vista da minha janela e minha própria vista. Afinal, quem viaja para fora só está procurando viajar para dentro. Eu queria jogar tudo para o alto e acabei jogando tudo numa mala. Eu queria o novo, o louco, o impossível e o imprevisível.
Eu já não queria limites, queria ser livre. Eu desejava movimento e por isso resolvi voar. Ainda quero tudo isso. O medo começa a dar lugar ao conforto. A vista da minha janela já mudou. O sol e os prédios deram lugar à chuva e uma ruazinha quase deserta. Eu já não me arrependo. E já quero mais.
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