Que o intercâmbio tem o seu lado positivo muito maior que o negativo, isso já sabemos. Mas muitos dizem que só se dão conta disso quando voltam e retomam sua vida no Brasil. No entanto, não podemos falar somente das coisas boas sem informar também o que pode acontecer de negativo. Por isso, criamos a série “Intercâmbio em preto e branco“, onde falaremos sem meias palavras sobre problemas que fazem parte do cotidiano do intercambista, iniciando pela dificuldade em falar outra língua. A intenção é mostrar que essas situações acontecem com quase todo mundo e que é possível superar e seguir sem afetar seus objetivos.
Pode parecer besteira, mas falar outra língua em um país que você não está adaptado pode te colocar em algumas situações constrangedoras, e isso é algo que provavelmente também acontecerá com você também seu intercâmbio. Quando você menos perceber, estará andando pela rua, pensando na vida pela quinta vez ao dia e alguém te perguntará uma informação em inglês. E aí… BUM! Travou!
Por mais que estudemos e nos preparemos, o sotaque dos nativos pode ser um dos motivos que te faz travar na hora de falar. Eu mesma, quando estava comprando remédios em uma farmácia aqui em Dublin, fui abordada por uma gentil senhora irish que desembestou a falar um monte, por ter achado de alguma forma que eu estava entendendo o que ela falava. Lembro que enquanto ela falava eu pensava “Meu Deus, eu dou risada, aceno com a cabeça ou saio andando? Não estou entendendo nada!”. Frustrante? E como!
Muitas vezes achamos que, por optar em fazer o intercâmbio e mergulhar na cultura local, teremos uma evolução meteórica em nosso aprendizado. Mas a realidade pode ser bem diferente, principalmente no começo. São tantas preocupações no primeiro mês, de ter seu visto em mãos a acomodação fixa, trabalho e tudo mais, que muitas vezes acabamos por deixar em segundo plano o estudo e não evoluímos como queríamos no inglês.
É comum esse tema nas conversas entre os intercambistas. A sensação é que entre o segundo e terceiro mês você entenderá que é mais complicado do que imaginava fazer tudo isso e ainda conseguir tamanha evolução no estudo, o que faz com que bata aquele desânimo. Nessa fase, nada como conversar com pessoas que estão há mais tempo por aqui pra que você consiga avaliar sua situação de uma forma mais clara e consiga resolver isso sem entrar em crise.
João Rodrigo, 24 anos e há 2 meses e meio em Dublin.
“Assim que cheguei em Dublin, obviamente comia muito no McDonald’s e Burguer King e ele viviam me perguntando se eu queria o “Meal”, que é o nosso “combo” no Brasil, ou seja, a refeição completa. Mas eu não entendia e tinha vergonha de perguntar, então sempre respondia com “French fries, please” (batata frita), o que não era uma boa escolha, pois por aqui eles nunca me entendiam e sempre devolviam um “sorry?”. Minha saída? Falava um “Soda and everything else” e torcia para que ele entendesse que queria o combo! Só fui entender o que “meal” significava quando um dia, bêbado, fui no Burguer King e prestei mais atenção na comunicação deles.”
Aline Silvestre, 27 anos e há 10 meses na Irlanda.
“Quando eu cheguei em Dublin, estava morando com uma família em D15 e a única palavra que eu sabia falar era “sorry”. Para ir à escola eu usava o DART, mas aos finais de semana o DART acaba cedo! Então, para ir a uma festa no centro, resolvi pegar o ônibus. Entrei, falei ao motorista que queria ia ao centro e entreguei uma nota de 5 euros. Como resposta, tive um belo e sonoro “NOOOO, I NEED COINS”. Gelei na hora, pois não entendi nada. Eu estava com o dinheiro e disse o destino, olhando pra cara dele. O ônibus já estava andando e eu tentando fazer ele aceitar o dinheiro enquanto ele gritava sem parar “Coins, coins, coins…” Até que no ápice do desespero, eu parei pra pensar “O que é coins??” e me lembrei que significava moedas, por causa de um joguinho que eu tinha no celular. Juntei as benditas moedas e ficou faltando 5 centavos, o que deixou o motorista um pouco mais bravo, mas ele aceitou. Lembro que sentei querendo que o banco me absorvesse de tanta vergonha. Essas situações acontecem! Hoje sou nível intermediário e consegui emprego como Au Pair em Cork. Tenho amigos de várias nacionalidades e, mesmo com os errinhos que ainda acontecem, estou muito satisfeita com minha evolução.”
Emanuely Mallmann Knorst, 23 anos e há 8 meses em Dublin.
“Estava eu preocupada em arrumar os documentos necessários para o Irish Residence Permit -IRP e só faltava o statement. Eu precisava ir até o banco solicitar e aí começou a confusão. Não sabia onde era o banco, mesmo com o endereço em mãos. O Google Maps não estava ajudando, então comecei a pedir informação na rua. As pessoas explicavam e tudo o que eu ouvia eu não conseguia assimilar. Comecei a ficar nervosa e quando eu fico nervosa demais eu choro. Enfim, passadas uma hora e meia, eis que eu encontro o banco. Na recepção, conversei com a recepcionista, que logo de cara foi bem simpática, conversou comigo calmamente, e tentou desvendar o que eu estava falando, até que chegamos a um consenso que eu estava pedindo alguma coisa (ela entendeu que eu queria abrir a conta). Alguns minutos depois aparece o gerente, todo calmo, dizendo pra eu pegar os documentos necessários. Eu tentei explicar pra o que eu estava querendo e nessa hora eu travei. Não conseguia mais falar nada! Comecei tremer, chorar, querendo voltar pro Brasil. Ele pediu pra eu ficar calma, e eu liguei pra minha amiga que me ajudou a pedir o extrato. No final tudo deu certo e demos até uma risada sobre o acontecido”
Rafael Lanzone Guerra, 25 anos e há 2 anos em Dublin.
“Cheguei sem nada de inglês. Na loucura de tudo, torrei todo meu dinheiro em 3 meses e tive que começar a procurar emprego, mesmo com um nível de inglês bem baixo. Após algumas tentativas, consegui uma entrevista em uma empresa de auditoria e controle de estoque. Me lembro como se fosse ontem. Cheguei ao local da entrevista e um irlandês me colocou em uma sala e disparou a falar sobre a empresa e sobre o trabalho. Eu só concordava com o mesmo e falava “SURE”, “OF COURSE”, e “YES”. Por fim, entendi que ele mandou voltar no outro dia para um teste. Voltei junto com mais 7 pessoas. Ele deu o equipamento de trabalho e uma folha em branco e comecou falar e falar e eu sem entender nada, mesmo me esforçando muito. Quando me dei conta, ele pediu para colocarmos em prática o que ele havia ensinado. Nisso, olhei para o lado e o pessoal cheio de anotções e ligando a máquina. Eu nao sabia nem ligar a mesma! Ai bateu o desespero! A vontade de voltar pro Brasil tomou conta e tudo começou a passar pela minha cabeça e comecei a chorar. No final, o cara foi muito bacana e me ensinou na prática como tudo funcionava. Resultado? Trabalhei lá por 6 meses”.
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