A coisa mais legal de morar no exterior é dizer para os gringos que você é brasileiro. Desde que cheguei aqui venho colecionando reações das mais variadas. Uma vez, um irlandês duvidou da minha resposta por eu ter olhos verdes. Tive que “provar”.
– So, speak portuguese, man!
– Isso é sério ou é zoeira?
– I know “zoeira”! You are paulista, velho!
Amigos nisseis e sanseis precisam fazer o mesmo quando encontram asiáticos. Assim como eu, um colega também foi desafiado para um duelo de idiomas.
– Watashi wa anata ga burajiruhito to naru to wa kangaete inai.
– Oi?
A noiva de um brother teve que explicar na imigração como tinha passaporte espanhol se era brasileira. Ela até pensou em tirar onda com a cara da oficial. “Comprei no Classificados Dublin. Já ouviu falar?”. Mas para evitar problemas, acabou contando a história verdadeira. Achei prudente da parte dela.
Certa vez, após me perguntar de onde eu era, um inglês desandou a fazer perguntas sobre violência. Queria saber se era verdade que estávamos sequestrando europeus durante a Copa do Mundo.
– Claro! Depois vamos pedir resgate pros governos deles.
– Really?
– Aham. Quanto a rainha pagaria por você?
Ele ficou assustado, eu disse que era brincadeira e fui obrigado a explicar que apenas brasileiros são autorizados a falar mal do Brasil.
– Eu posso! Você não!
Então passei a contar-lhe histórias sobre os adoráveis seres que habitam o nosso Congresso Nacional.
Um italiano nem deixou eu terminar de responder e já disparou a falar sobre futebol. A belga e francesa começaram a cantar Michel Teló. O alemão quis saber mais sobre o nosso “espírito festeiro”. A polonesa ficou toda feliz por encontrar um latino para praticar espanhol.
– Puede ser portuñol?
É incrível! Eles ficam felizes quando descobrem de onde somos. E o mais interessante é que eles encontram brasileiros TODOS OS DIAS. Não deveria ser tão novidade assim…
– Por que tem tanta gente do Brasil vindo para cá?
– O que acontece no país de vocês que todo mundo tá fugindo de lá?
– Tem mais gente vindo? Acho que não tem mais espaço.
– Vocês estão colonizando a Irlanda?
Sim, estamos! Na verdade, tudo faz parte de um plano maligno do governo brasileiro para exportar nossa cultura mundo afora, começando pelo povo Irish. No último relatório enviado à terra mãe pelos bravos soldados que aqui estão, é possível verificar conquistas consideráveis. De acordo com o documento sigiloso, 100% dos brasileiros residentes em Dublin estavam ou estão ensinando português para pelo menos um gringo. Eu faço a minha parte. A francesa já sabe mandar os caras mais assanhados da balada tomar naquele lugar. A irlandesa do trabalho nunca mais falou “good morning”. Ela acha “bom dia” muito mais legal e animado. O espanhol sempre pergunta se eu quero “breja”. A americana só agradece com “obrigada”. A polonesa que queria falar espanhol virou minha namorada e vive pedindo “carinho”. O coreano, surpreendentemente mais atrasado do que os demais no aprendizado, ainda está na fase do “nossa, nossa, assim você me mata”.
Confesso que sinto-me extremamente bem quando vejo um estrangeiro tentando aprender a língua portuguesa. Viemos para cá estudar a língua dos caras e agora são os caras que querem estudar a nossa língua. Surreal! E mais do que isso, eles parecem desejar ter o mesmo estilo de vida que o nosso: abraços, risos, farra, calor humano, churrasco, cerveja gelada. É nítida a diferença de humor entre um gringo que convive com brasileiros e outro que mantém distância.
Obviamente, essa relação globalizada é carregada de estereótipos, o que não é necessariamente ruim. Afinal, são justamente os pré-conceitos que despertam a curiosidade e os fazem se aprofundar mais em nossa cultura. Aí, claro, depois de um tempo em nosso meio, eles percebem que nem sempre estamos em festa (com exceção dos vizinhos brasileiros do andar de cima). Quando o nível de intimidade chega neste ponto, já é tarde demais: você e o gringo já se tornaram grandes amigos.
E eis que surge o maior problema do mundo para todo brasileiro que mora no exterior: onde hospedar todos os amigos estrangeiros quando eles forem te visitar no país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza? Pelas minhas contas, precisaria reservar um hotel inteiro para cumprir as promessas de hospitalidade já feitas. Ou talvez eu possa distribuí-los nas casas da irmã, do pai, da mãe e de alguns outros parentes. E depois disso? O que fazer? Eles já me disseram que querem conhecer Rio de Janeiro, Nordeste (inteiro), Floripa e a Floresta Amazônica. “É tudo muito longe”, adverti-os. “Não se preocupe, a gente aluga um carro”, respondeu o animado coreano. Dei risada. Ele também, embora não tenha entendido o motivo de tanta graça.
Na semana passada eu chamei seis gringos para irem ao pub assistir um jogo do Brasil. Eles aparecerem com camisas da seleção. Todos. Torceram como nunca. Berraram, gritaram, beberam, celebraram. Mas o sorriso estampado no rosto do coreano sumiu quando um colega puxou assunto.
– Where are you from?
– Korea.
Ele queria poder dizer “Brasil”.
Revisado por Tarcísio Junior
Imagens via Shutterstock
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