A experiência fora de casa num país novo traz mil cores dentro do olhar do viajante. Tudo é lindo, e cada desafio é enfrentado com o desejo de vencer e se tornar mais forte a cada dia. Um sonho feito de algodão doce, não sempre açucarado, mas, ainda assim, cheio de surpresas em cada mordida. Até que chega a notícia inesperada e somos pegos desprevenidos com um simples telefonema: aquela pessoa querida veio a falecer.
A vida é feito de abandonos, e, para nós que decidimos viver na estrada, o desapego é a coisa mais bonita que vivemos. Abrimos mão de tudo para nos achar novamente, como se a estrada nos fizesse virar do avesso. De todas as vivências, só levamos a experiência. E quando achamos que atingimos o auge da maturidade afora, a notícia da perda de um amigo ou familiar nos coloca à prova novamente.
O luto será vivido sozinho e pouco terá com quem compartilhar a dor da perda. Não que não haverá apoio, não é isso. Mas o compartilhamento da dor da perda se torna um processo solitário e obrigatório. Você vai ter que enfrentar essa passagem sozinho. Entre todas as explicações físicas e subjetivas, a morte é de longe a mais certa, todavia, a mais difícil de se aceitar.
Quando recebi a notícia do falecimento da minha amiga Leila, fui arrebatada com todos os clichês existentes. O chão se abriu diante mim, o dia acinzentou num tom opaco e acordava todos os dias num susto, como se estivesse levando um soco na barriga para abrir os olhos e enxergar a realidade. Na tentativa de buscar consolo, encontrei com meu amigo Eamon Mag Uidhir, um poeta de sessenta e pouco anos. Achei que ele tivesse algo a dizer que pudesse me salvar da dor, mas a linha poética era crua e sem rima “Na minha idade é quase um por mês”. Foi assim que percebi que Leila se tornava a primeira estrela. Num grupo de amigos que estudaram, brigaram e se conheceram, ela é a primeira a dizer adeus.
A morte só se aprende com a morte, não tem jeito, e Leila foi a primeira, dentro de um círculo de amigos no qual conheço todos, a deixar o plano físico. Se Leila fosse musicista, seria punk. Se fosse artista visual, abstrata. Se fosse escritora, contracultura. E se conhecesse David Bowie e Bjork, teria ido para a cama com ambos.
Quando penso no porquê de Leila — e assim como todas pessoas que perdemos serem especiais — me vem à cabeça algo que meu pai disse, não com essas palavras, mas que entendi assim: É preciso ser forte nas suas convicções e bondade, pois será por isso que será lembrado.
Leila era uma mulher forte, não acreditava no perigo, só no preconceito do careta, que deve ser combatido. Uma mulher cheia de exageros que ia do seu sorriso largo, passeava pelas suas loucuras, por fim, chegando ao coração de quem atravessava seu caminho. E isso tudo me faz entender a fala do meu pai e minha dor pela perda de uma amiga tão querida.
A saudade toma conta da casa, muito embora Leila nunca tivesse me visitado aqui do outro lado do oceano, na forma de um vasinho de planta que rego todos os dias para não morrer, tornando-se assim presente e continuando a ser parte da minha vida.
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