A Alta Corte da Irlanda sentenciou que, para dar entrada no processo de naturalização irlandesa, ou seja, aplicar para a cidadania, o requerente não pode ter se ausentado do país, nem mesmo por um dia, no último ano de residência. A Lei de Nacionalidade e Cidadania Irlandesa (Irish Nationality and Citizenship Act), de 1956, afirma que estrangeiros têm direito à cidadania se viverem no país cinco anos, sendo que o último precisa ser uma “vivência contínua”, mas esse termo nunca foi interpretado com tanta rigidez.
O E-Dublin explica o desenrolar desses fatos e mostra como isso pode prejudicar brasileiros que estão prestes a aplicar para a cidadania. Vale lembrar que mais de 8.000 pessoas receberam a cidadania irlandesa em 2017, segundo dados da Eurostat, e apenas 264 destes são brasileiros.
Os especialistas em leis de naturalização da Irlanda têm chamado de “absurda” a sentença que afirma ser proibido o requerente da cidadania irlandesa de sair do país no último ano de sua residência. O julgamento aconteceu neste mês de julho de 2019 e foi proferido pelo juiz Max Barrett, que obrigou as pessoas em processo de naturalização que provassem não terem saído da Irlanda durante todo o ano de 2018.
O termo de “vivência contínua” no último ano de residência, dos cinco obrigatórios na Lei de Nacionalidade e Cidadania Irlandesa, nunca foram tão estritamente cobrados. O Departamento de Justiça e Igualdade permitia até seis semanas fora do país, já que a lei não especifica a quantidade de dias.
A decisão de Barrett, porém, foi interpretada com base no dicionário. Ele considerou que “contínuo” significa “’ininterrupto”, ou seja, no caso da “residência contínua”, isso seria “nem um dia fora do país”.
Segundo ele, seu julgamento “pode parecer injusto”, mas era o que a lei exigia, literalmente. Ele disse que, se houver injustiça, ela está na lei e não, nos tribunais.
Advogados e especialistas de todo o país estão chocados com a regra. Segundo comentários e entrevistas na imprensa irlandesa, a opinião é que não se pode “enjaular” um candidato à cidadania irlandesa durante 12 meses dentro da Irlanda.
Muitos dos candidatos, por exemplo, vivem na fronteira entre a República da Irlanda e Irlanda do Norte e, inevitavelmente, cruzam a linha entre os dois países. Em entrevista ao The Journal, a advogada de imigração Aoife Gillespie disse ser “um absurdo exigir que uma pessoa seja detida no Estado por um ano inteiro para se qualificar para a cidadania irlandesa”.
Aoife Gillespie explicou que cidadãos estrangeiros residentes na Irlanda não devem entrar agora com o pedido de cidadania se tiverem saído do país nos últimos 12 meses. Eles devem esperar que a posição legal seja resolvida para “não perder a viagem”. Isso porque os pedidos de cidadania para quem saiu do país nesse período seriam recusados.
A tendência é que a Divisão de Cidadania fique estagnada até a resolução do caso na Alta Corte ou em uma possível mudança da lei de 1956, na qual se esclarecem quantos dias o requerente pode ficar fora do país nos últimos 365 dias anteriores à aplicação.
Requerentes de passaportes irlandeses, com base no fato de ter pai ou avô irlandês, não serão afetados, pois não há requisito de residência para a cidadania por descendência.
O governo irlandês soltou nota em seu site oficial afirmando estar ciente do julgamento e saber que a situação pode ser perturbadora para pessoas que estão no processo de cidadania. “Pedimos a sua paciência enquanto implementamos uma solução com urgência”, diz a nota.
A Divisão de Cidadania continua recebendo e processando inscrições, e a cerimônia de cidadania que acontece em setembro está em andamento. “Não estamos aconselhando os candidatos à cidadania ou futuros candidatos a cancelar quaisquer planos de viagem atuais ou futuros”, ressalta a nota.
Segundo eles, o único conselho é que essas pessoas continuem a coletar todas as provas necessárias para dar suporte ao pedido de cidadania. “Quando uma solução estiver em vigor, se for necessária alguma informação adicional, você será contatado como parte do processamento de sua inscrição.”
O governo também não acredita que a decisão tenha consequências para quem já obteve a cidadania.
Para quem está se preparando para dar entrada no processo, um canal de contato em caso de dúvidas está disponível neste link.
O processo de naturalização de estrangeiros por residência na Irlanda não é um dos mais complicados entre os países europeus. Exigências mais rígidas são encontradas em diversas nações da Europa, muitas delas, inclusive, que exigem do estrangeiro o abandono da própria nacionalidade.
Assim como na Irlanda, no Reino Unido, é preciso provar que vive no país há cinco anos. É exigência também ser maior de 18 anos, não ter ficado ilegal no país, ter conhecimento do inglês, entre outras.
A lei do Reino Unido, no entanto, define bem a respeito da continuidade. São permitidos 450 dias fora do país durante os cinco anos, sendo, no máximo, 90 dias no último ano. Foram 898 brasileiros naturalizados cidadãos do Reino Unido em 2017, segundo a Eurostat.
O processo na Suíça também é difícil. São, ao menos, 10 anos como residente para iniciar o processo de naturalização. É preciso provar que você sabe sobre a história da Suíça em uma avaliação exigente. Se você reprovar, o governo demora para autorizar o requerente a fazer uma nova prova.
Entre as regras da cidadania alemã estão a permanência de oito anos de residência contínua e a fluência no idioma alemão. Um teste de cidadania é realizado para saber sobre o conhecimento do requerente acerca da Alemanha. É preciso também estar empregado no país e ter ficha criminal limpa. Foram 1.169 cidadãos brasileiros naturalizados alemães em 2017, segundo a Eurostat.
Na Áustria, por exemplo, um estrangeiro precisa viver no país, pelo menos, 30 anos de maneira continuada. O tempo pode diminuir para 15 anos se houver comprometimento provado de integração com a sociedade. Além disso, é preciso saber o alemão fluente e abrir mão da nacionalidade original. Trinta e nove brasileiros foram naturalizados austríacos em 2017, segundo a Eurostat.
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