Um mês em Dublin ou o horizonte é logo ali
10 anos atrás
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Por Júnior Milério
Da primeira vez, me deixou impaciente, porque ainda restam em mim sequelas frenéticas do dia-a-dia paulistano. Mas agora já me encanta ver as pessoas paradas para atravessar uma rua dublinense, mesmo que não haja carros passando ou se aproximando. Apenas por que o sinal para pedestres está vermelho. Aqui, a vida não precisa ser desesperada.
Definitivamente, morar é diferente de ser turista. E quando cheguei à terra natal de Oscar Wilde, em vez de correr atrás de estátuas do James Joyce pela cidade, precisei abrir conta em banco e descobrir a melhor loja para comprar meias. Parênteses: ainda bem que trouxe meu cortador de unhas afiado. Onde eu encontraria outro por aqui?
Ainda não comi fish and chips na Irlanda. Talvez por que ache contraditório irlandeses historicamente desgostarem dos ingleses e não se esforçarem para ter um prato típico diferente do da Terra da Rainha e tão emblemático quanto. Porém, confesso: não sei quem fez a receita primeiro. Vai ver foram os ingleses que plagiaram o prato cheio de peixe e batata frita durante a exploração.
Li por aí que a alcunha “Ilha Esmeralda” é pelo verde que se espalha pelo país. Mas sempre desconfio dessas teorias propagadas em tempos de cliques demasiados. No entanto, o verde irlandês hipnotiza – e isso é incontestável. Primeiro pensei que fosse pela qualidade da lente, mas reolhei e olhei novamente. Resultado: queria morar numa pétala de trevo da sorte para visualizar o verde-vivo todos os dias. Afinal, em breve chega o inverno, frio cruel, e nada de verde nas copas das árvores ou na grama do chão.
O interruptor fica sempre em lugares distintos dos que conheço. Na maioria das vezes, é preciso ligar a lâmpada antes de entrar no cômodo, do lado de fora. Acho curioso, mas com isso já estou quase acostumado. O que ainda me intriga, mesmo, é a bendita da mão-inglesa.
Eu, que nunca dirigi, não imaginava que isso refletisse tão intensamente na vida dos pedestres. Na dúvida, agora olho para todos os lados para saber se vem um carro ou uma bicicleta (me faz sorrir a quantidade de bicicletas e ciclistas nas ruas).
Dublin abraça quem chega – talvez para proteger do vento. Mas abraça. Meço o quanto uma cidade é cosmopolita pela quantidade de executivos de terno, gravata e tênis. Afinal, ainda é quebrar paradigmas preterir sapatos desconfortáveis. Por aqui já vi alguns. Nada mal para um país que tem um poeta como presidente, Sinéad O’Connor, Enya, Dolores O’Riordan, e claro, Bono.
Eu, que vim melhorar o inglês e curioso pela cultura e história irlandesas, assim que cheguei a Dublin fui arrebatado pela altura média dos prédios. De tão baixos, quando olhei para o alto e vi o céu tão aberto, só consegui pensar uma coisa: o horizonte é logo ali.
Júnior Milério é jornalista especializado em cultura, escreve sobre gastronomia e sonha em conhecer todas as palavras do mundo. Acredita que o sotaque do interior paulista facilita na hora de falar inglês. Para conhecer um pouco mais sobre Junior acesse about me/juniormilerio.
Este texto foi revisado por Camilla Gómez em Setembro/2014.
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